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domingo, 21 de fevereiro de 2010

Acessibilidades do Espaço e Silêncio do Interior

A relação entre as acessibilidades do espaço e o desenvolvimento de actividades geradoras de riqueza tem vindo a marcar a agenda dos investigadores nas áreas de geografia económica e economia do empreendedorismo. De forma crescente os governos nacionais e regionais por toda a Europa têm ancorado a sua agenda política nos resultados dessa investigação que é progressivamente transferida para a agenda das políticas públicas orientadas para o crescimento endógeno e o aumento da produtividade das unidades territoriais do espaço europeu.

De forma estranha e inusitada os fazedores de políticas públicas do espaço geográfico constituído pela Beira Interior Norte e Beira Interior Sul têm vindo a manter um silêncio ensurdecedor no que concerne ao mapa de acessibilidades e à logística destas unidades territoriais de fronteira.

Existem duas dimensões de actuação possível ao nível do repensar da estrutura logística de acessibilidades destas duas unidades territoriais, abreviadamente designadas por Beira Interior, ou seja, o nível macro e o nível micro de actuação.

Ao nível macro é imprescindível desbloquear a desvantagem competitiva originada pelo obstáculo (ou oportunidade) geográfico(a) chamado(a) Serra da Estrela. A solução é irrefutavelmente a construção dos túneis que permitam reduzir o tempo de viagem e os custos de transporte associados às ligações rodoviárias entre o interior e os distritos de Aveiro (a Noroeste), de Coimbra (a Oeste) e de Leiria (a Sudoeste).

Esta dimensão não deve ser abandonada e silenciada pois a sua execução pode contribuir para a alteração substancial do mapa de acessibilidades do interior, bem como da sua capacidade competitiva, por via de uma desejável interligação da Região Centro do país.

Adicionalmente, a plataforma logística pensada para a Guarda deveria ser servida por um terminal intermodal de transportes que contemplasse a convergência e a permuta entre os meios de transporte rodoviário, ferroviário e aeroportuário.

A construção de um aeroporto internacional com ligação directa a pelo menos três plataformas europeias de transporte aeroportuário, nomeadamente, Lisboa, Londres e Madrid, é uma condição fundamental para dar resposta à procura crescente por este tipo de ligação internacional, por parte dos agentes da administração pública (entidades camarárias, e instituições de ensino superior e investigação e desenvolvimento) e do tecido empresarial.

No que respeita ao nível micro, o reforço da massa crítica de aglomerados populacionais de dimensão média, tal como sucede nos casos dos concelhos da Covilhã e do Fundão, merece uma especial intervenção, designadamente, através da reabilitação e edificação de uma rede ferroviária para circulação em anel de um comboio de superfície, destinado mormente ao transporte de pessoas e mercadorias, em ambiente urbano e inter-regional.

Ainda a nível micro, os concelhos mais interiores dos distritos da Guarda e de Castelo Branco podem ser aproximados dos centros urbanos de média dimensão, tendencialmente, administrados sob o conceito aglutinador de cidade-região. O caminho a seguir é transformar a via estruturante A23 num “Y” bifurcado com ligação à A25 (a Norte, para ligação a Salamanca e a Madrid) e à futura ligação a Espanha, via Monfortinho (a Sul, para ligação a Cáceres e a Sevilha).

Estranho silêncio reina em torno de uma questão crítica para alavancar o crescimento endógeno do interior. Será falta de capacidade reivindicativa ou pura paralisia face ao cenário de deficit público crescente?

As operações de maquilhagem ao nível regional são positivas quando pensadas estrategicamente, mas penso ser o tempo de, sob uma lógica de cooperação inter-municipal, avançar para a celebração de parcerias público privadas (PPPs) para desbloquear definitivamente as acessibilidades anestesiantes de um interior que se sente mais adulto e exigente, face às privações a que tem sido votado pela sua localização no espaço geográfico português e europeu, perfeitamente ocidentalizado.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

O Futuro nas Organizações

«All our knowledge is about the past, and all our decisions are about the future» (American Association for the Advancement of Science, 1975).

Não conhecemos o futuro, mas podemos pensar sobre futuros alternativos, esboçando pressupostos através de cenários. Estes desenvolvem uma estratégia flexível, estabelecendo as fronteiras entre as incertezas e os limites de futuros plausíveis. Wack (1985) e Heijden (1996) consideram que os cenários servem para redesenhar os nossos mapas mentais do futuro, organizando as percepções sobre futuros alternativos nos quais as decisões estratégicas assentam (Kaunonen 2001). Assim, as organizações ao alargarem os seus modelos mentais ampliam também a sua capacidade para reconhecer potenciais mudanças de paradigmas, disrupções, incertezas e temas emergentes, encorajando os decisores a antecipar e compreender melhor o ambiente externo e a forma como este interage e influencia as decisões estratégicas.

O planeamento de cenários é uma ferramenta de gestão, usada cada vez mais por grandes empresas, permitindo antecipar a evolução do enquadramento da organização de forma a iluminar a tomada de decisão e/ou redefinir uma nova visão estratégica. Deste modo, ajudam as organizações a tornarem-se mais flexíveis, menos resistentes à mudança e mais adaptadas a um futuro que pode não ser previsível. A organização mais bem preparada, flexível e adaptada a várias possibilidades irá deter uma vantagem competitiva no futuro face aos concorrentes.

A fábula de Spencer Johnson, “Who Moved My Cheese” (um livro sobre a resistência à mudança pessoal e das organizações), conta a história de dois ratos e dois homenzinhos que viviam num labirinto com o mesmo objectivo, encontrar queijo. Ao encontrarem um posto repleto de queijo, todos ficam felizes. No entanto, os personagens esquecem-se que ao longo do tempo o queijo vai acabando ou vai ficando velho. Outra conhecida parábola sobre mudança é “Our Iceberg is Melting” de John Kotter e Holger Rathgeber, sobre uma colónia de pinguins imperadores que viviam num iceberg de acordo com a tradição há muitos anos. Contudo, um pinguim curioso e observador, Fred, descobre que um problema potencialmente devastador ameaçava o lar da sua colónia, mas de forma geral nenhum pinguim lhe presta muita atenção.

Estas fábulas podem ser transpostas de várias formas para o mundo em constante e vertiginosa mudança. Nelas percebe-se a tentativa dos personagens identificarem pequenos sinais de mudança, como “cheirar o queijo com frequência para saber quando está a ficar velho”, ou a curiosidade e perspicácia do pinguim Fred que todos os dias analisava cuidadosamente as alterações no iceberg onde vivia. Existem inúmeras maneiras de dizer a mesma coisa, mas o que é realmente importante é perceber as tendências e notar cedo as pequenas mudanças (week signals) porque ajuda na adaptação das maiores que irão surgir no futuro. Contudo, é uma identificação dificil uma vez que os week signals são constituídos essencialmente por indícios oriundos de fontes diversas (Elina Hiltunen 2007).

Os cenários devem contribuir para gerar mudanças vantajosas para as organizações garantindo o seu sucesso. No entanto, a gestão da mudança é extremamente difícil e as empresas portuguesas ainda são muito resistentes à mudança, designadamente as de pequena dimensão geridas pelos ideais e valores dos fundadores. Para quem come muito queijo e não o cheira com frequência para ver se está a ficar velho, lembro que mudar e inovar é inevitável.